A mãe que sai e a mãe que volta
- Daniela Delias

- há 5 dias
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Ela se abaixa para dar um beijo, mas o pequeno agarra o pescoço como quem tenta segurar o tempo. O corpo dele se enrosca no dela, e por um instante ela pensa em ficar. Mas o relógio já avisa: é hora de ir. Na porta, o choro ecoa como um lembrete de que o amor também dói um pouco quando precisa partir.
No caminho até o ponto, o barulho da cidade vai tomando o lugar do choro. Ela se lembra de quando ele era bebê e bastava ela sumir do campo de visão para o mundo dele desabar. Parece que, toda vez que sai de casa, ela revive aquela mesma cena: o bebê que aprende a suportar a ausência e a mãe que precisa suportar a culpa.
Freud, um dos fundadores da psicanálise, dizia que esse é um dos primeiros desafios da vida: perceber que a mãe é um outro ser, que vai e vem, e que nem tudo o que amamos está sempre ao nosso alcance. É nesse movimento que a criança começa a descobrir o que é esperar, desejar e confiar.
Winnicott, um psicanalista inglês, acreditava que o bebê não precisa de uma mãe que esteja o tempo todo presente, mas de uma mãe que vá e volte. É nessa dança de presenças e ausências que ele aprende a suportar a falta e a descobrir que o amor continua, mesmo quando o olhar da mãe não está ali.
Talvez seja assim também com ela: cada vez que sai, precisa acreditar que continua sendo mãe mesmo quando ninguém chama por ela. E, de algum modo, o filho pode aprender com ela algo sobre a presença que fica mesmo quando o corpo vai.
No trabalho, o tempo tem outro ritmo. O nome dela não é “mãe”, é o nome do crachá. Há conversas de adulto, café quente, silêncio. Um alívio que vem sempre acompanhado de culpa. Entre planilhas, vozes e notificações, ela reencontra uma parte de si que estava guardada entre fraldas e brinquedos.
Elisabeth Badinter, uma filósofa francesa, escreveu que o maior desafio da mulher moderna é equilibrar o amor pelos filhos e o amor por si mesma sem precisar escolher entre um e outro. Talvez seja isso o que ela faz todos os dias, sem perceber: tenta não se perder da mulher que era antes de ser mãe, e ao mesmo tempo não se afastar demais da mãe que se tornou.
À tardinha, o caminho de volta é outro. O corpo cansado, o coração ansioso, o pensamento correndo à frente do passo. Ao abrir a porta, o cheiro do filho a atravessa inteira. O abraço apaga o dia e reacende tudo o que ficou suspenso.
A mãe que sai não é a mesma que volta. A cada ida e volta, ela se perde e se reencontra de outro jeito.







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